São Paulo homenageia única sobrevivente da Casa da Morte


  Inês Etienne Romeu em julgamento no auditório do Exército do Rio após prisão na ditadura em 1972 (Foto: Folhapress)


de Março de 2013 - 10h54

Única sobrevivente da Casa da Morte, centro de tortura mantido pela ditadura militar em Petrópolis (RJ), Inês Etienne Romeu foi homenageada em uma audiência pública na Assembleia Legislativa. O encontro foi promovido nessa segunda-feira (25) à noite pela Comissão Nacional da Verdade, juntamente com a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo Rubens Paiva. Debilitada, Inês, não pôde, no entanto, comparecer à audiência.


Militante da Vanguarda Popular Revolucionária, ela nasceu em 1942 e foi presa em 1971, acusada de participar do sequestro do embaixador suíço. Ficou 96 dias na Casa da Morte, sendo a única pessoas que se conhece que saiu viva do local. Enquanto esteve lá foi torturada, estuprada e humilhada. Só sobreviveu porque fingiu concordar em colaborar com o regime para denunciar companheiros de luta.

“Levava choques elétricos na cabeça, nos pés, nas mãos e nos seios. A certa altura, o Doutor Roberto [torturador] disse que eles não queriam mais informação alguma, estavam praticando o mais puro sadismo. Eu já havia sido condenada à morte e ele, Doutor Roberto, decidira que ela seria a mais lenta e cruel possível, tal ódio sentia pelos terroristas”, disse Inês em depoimento lido na ocasião e que faz parte do livro Luta, Substantivo Feminino.

A ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para as Mulheres, destacou a importância da resistência de Inês. “A sua coragem e ousadia permitiram que soubéssemos da existência da Casa da Morte”, disse em um discurso emocionado em que também ressaltou o significado pessoal que a cerimônia tinha para ela. “Eu não estou aqui na condição de ministra, estou na condição de mulher, de ex-presa política, de amiga da Inês”.

Eleonora lembrou como a experiência da prisão marcou profundamente as mulheres que sofreram nos porões da repressão. “É importante reconhecer, nós temos força, mas muitas das nossas doenças são decorrentes do que passamos na cadeia. Por outro lado, a nossa força vem dela, a disciplina, a determinação e a nossa ética com a coisa pública”, acrescentou, pouco antes de encerrar sua participação.

Integrante da comissão estadual, Amélia Teles falou sobre as dificuldades das mulheres para superar as agressões sexuais a que foram submetidas pelos agentes da ditadura. “Faz 40 anos e eu falo com dificuldade [sobre isso]”, disse. “É um peso muito grande falar da violência sexual, você fica muito estigmatizada”.

Amélia contou que até o fato de ser mãe foi usado contra ela nas torturas em que exploravam o gênero da vítima para aumentar o sofrimento. Seus filhos pequenos foram levados para dentro da sala de tortura e viram seu corpo coberto de hematomas. Além disso, Amélia revelou fortes agressões sexuais que sofreu quando tinha 27 anos. “Em uma dessas sessões, um torturador da Operação Bandeirante, que tinha o nome de Mangabeira, se masturbava em cima do meu corpo quando eu estava amarrada na cadeira do dragão", contou.

A homenagem a Inês foi o primeiro encontro do Ciclo de Debates Verdade e Gênero, que discutirá a violência contra a mulher durante a repressão. Participaram da audiência o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, e a psicanalista Maria Rita Kehl, que também integra a comissão.

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